quarta-feira, novembro 25, 2009

As sensações

A redescoberta de sensações é uma coisa fantástica, quem um dia deixou de as reconhecer de certeza que assina por baixo.
Até as perder nunca lhes tinha dado grande importância, lá está, há coisas que só passamos a valorizar quando já não as temos. A fome, o sono, o frio, o respirar fundo, o cansaço, a dor ou a ausência dela; são básicos da vida de todos os dias aos quais respondemos como que automaticamente, sabemos quando os sentimos e reagimos ou, por uma razão qualquer, perdemos essa capacidade e a nossa existência passa a ser um pequeno caos. A decadência total.

Não se tem fome porque se confunde com náusea. Náusea essa causada pela fome, mas quem nunca teve fome não sabe o que é. Então passa fome. Sem saber. Começar a comer é uma violência, uma obrigação danada. E eis que um dia em que já é quase uma da tarde, não se olha para as horas, e sentimos-nos esquisitas. Mas o que é isto? É o corpo a pedir comida, está-se a habituar.

Passam-se tantas noites em branco que deixa de se reconhecer aquele momento em que os olhos se querem fechar. O desespero é tanto que quem manda no acto de dormir não é o sono mas um comprimido que desliga o interruptor bruscamente, sem darmos conta de como isso foi acontecer e que só sabemos que aconteceu de facto porque acordámos de manhã. Já há muito tempo, isto. Ontem à noite apercebi-me que estava naquele limbo entre os meus estados acordada e adormecida, naturalmente. Sentia o peso do edredon de inverno que finalmente fui buscar em cima de mim, sentia que a televisão fazia barulho e que havia luz a mais, se estivesse a ler era neste momento que o livro me caía em cima da cara, por isso nunca vou aderir aos kindle e companhia, deve magoar. Estava simplesmente cheia de sono. Aleluia.

Quando já tudo dói há tanto tempo deixa de se dar importância e passa a ser essa a norma. Continuamos a caminhar, a viver e até a rir, nem que seja de favor. Nem as queimaduras doem assim tanto, nem os cortes acidentais, nem os tombos, nem as estaladas, nem a água fria a cair há 20 minutos nas costas dói. E depois, passam-se semanas ou mesmo meses sem que vá ao chão, sem que me puxem o tapete, sem que me corte no papel, sem que precise de refrescar as ideias no duche ou dando um murro na parede e vou com a mão à placa. Se fosse de indução nem a sentia, mas não é, e queima. E dói.

E no dia em que, distraidamente, no elevador, respiramos tão fundo e sentimos que é a primeira vez? Se calhar em anos?
É um belo dia. Digo eu.

I.

2 comentários:

Miguel F. Carvalho disse...

é melhor não aderires às novas tecnologias livreiras... senão ainda tens uma "Kindle Surpresa"... :)

eu... disse...

tipo um galo na testa ou um nariz partido :)

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